domingo, 29 de novembro de 2009

As faces da saudade



Saudade não é apenas falta
Do que se teve e se perdeu,
Mas a lacuna dos incontáveis
Momentos que não se viveu.

Os olhos buscando insaciáveis
Imagens que a memória retém
Fragilmente, e que, de repente,
Qual sonho, turvam-se; vão e vêm.

Saudade é aquilo que se sente
De um futuro que nunca existiu,
De todos os anseios contidos,
De alguém que um dia partiu.

Saudade dos gestos reprimidos,
Da palavra pensada e não dita,
Dos desejos jamais saciados,
Da promessa de alegria infinita.


Shirley Carreira

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O poema de hoje

O poema de hoje
se recusa a ser moderno,
audacioso; contumaz,
quer-se apenas versos normais
que sussurram ao ouvido,
em murmúrios e gemidos,
o que os lábios
calam.

O poema de hoje
não almeja a rebeldia
da forma, o desafio
de ser "boa" poesia;
quer a simplicidade
da fala hodierna,
o transbordamento
do eu.


O poema de hoje
ignora a o urgência do tempo,
o ontem e o amanhã;
quer apenas o ato egoísta,
que escapa à técnica
e salta à vista:
olhar, atento, para dentro
de si.

Shirley Carreira

domingo, 22 de novembro de 2009

Teus caminhos

No azul dos teus olhos,
Um mar imenso,
Onde navego de olhos fechados:
Mergulho e entrega.

No toque de tuas mãos,
Um paraíso inteiro,
em que me recrio continuamente:
Desejo e êxtase.

Nas estradas de teu corpo,
Um oásis infinito
Onde deixo as minhas marcas:
Conhecimento e memória.

Shirley Carreira

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Palavras alheias...

RECEITA DE CASA....

Uma casa deve ter varandas
para sonhar, cantos para chorar,
quartos para os segredos
e a ambivalência.
Um amor precisa espaço de voar,
liberdade para querer ficar,
alegria, e algum desassossego
contra o tédio.
Não se esqueçam os danos a cobrir,
o medo de partir,
e o dom de surpreender
_ que é a sua essência.

Lya Luft

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Em segredo




Os passos calcaram a terra
Os sonhos ganharam as estradas
Os braços perderam-se no fosso
De incontáveis abraços
E as bocas lançaram laços
Às almas ressequidas.
Em segredo, teceu-se a teia
Incontrolável da vida.

Shirley Carreira

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

domingo, 8 de novembro de 2009

Mulher



Mulher

Não sou a mulher dos teus sonhos
Mas deixa-me, ao menos,
Invadir tua mente, sorrateiramente,
e roubar um pensamento teu.
Não sou a mulher que quiseste
Mas deixa-me, em teu sono,
Habitar teus desejos ocultos.
Não quero ser a mulher ideal.
Quero ser aquela mulher fugidia,
Que prende o teu olhar
Quando tu o desvias.
Quero ser aquela
Que, sem que tu permitas,
Faz parte da tua fantasia.

@Shirley Carreira

sábado, 7 de novembro de 2009

Deixa-me



Deixa-me sussurrar em teu ouvido
Um verso ousado, atrevido
A tatear os teus desejos
Sem o menor rastro de pejo.

Deixa-me desenhar no céu da tua boca
A minha marca, ardente, louca,
A sondar na tua saliva
A corrente que te ativa.

Deixa-me cravar em tua pele
O signo da paixão que me impele
A transformar-me, de mera passageira,
Em amante de uma vida inteira.

Shirley Carreira

A versificação do amor



















A versificação do amor
é sempre um quiasmo,
onde tudo se troca,
onde nada pertence a um só.
A versificação do amor
É feita de rimas perfeitas,
De aliterações e consonâncias
E de metáforas oníricas.
É repleta de hipérboles,
Carente de omissões.
A versificação do amor
Não deve ter métrica certa.
A variável, a surpresa,
Faz, do poema, a fortuna.
A versificação do amor
Não precisa de receita,
Mas de um homem e uma mulher
E de um permanente sentimento
De distanciamento do mundo.

Shirley Carreira

Saudade e silêncio
















Quando um amor
Se torna labirinto
E suas estradas levam
A lugar nenhum
A distância resgata
O que resta do sonho
E a chama perdura
Através da saudade.

Quando a imagem
Que se forma na mente
Distancia-se de todo
De seu referente
E só se encontram
Quando os olhos se fecham,
É o tempo da distância,
É o tempo do sonho.

A distância e a saudade
Fazem mais pelo amor
Que em si não se sustenta
Do que as idas e vindas
E a alegria fugidia,
Entremeada de dor,
De mágoa e de tormenta.
Na saudade tudo silencia.

Shirley Carreira

Se eu me calar











Não te espantes se eu calar meu verso,
com meu silêncio não te surpreendas;
comigo mesma vivo em contendas.
Na poesia, reúno e disperso
todos os fragmentos de mim.
Se me calo, eu me preservo.

Não te espantes se eu não deixar rastro,
não te assustes com minha ausência,
pois, da palavra, a permanência
é retrato preciso de um mundo vasto
que trago dentro de mim.
Se me calo, eu me oculto.

Não te surpreendas se eu me calar,
se partir sem dizer adeus,
se este poema parece acenar
com lágrimas dos olhos meus,
cascata caudalosa a escorrer da alma.
Se me calo, ela se acalma.

Ficam os gestos apenas ensaiados,
ficam os poemas mal iniciados,
sombras líricas de algo concreto.
Ainda que não possas lê-las,
minhas palavras permanecem.
Na noite do meu silêncio,
elas se tornam estrelas.
* * * * * * * * * * * *
Shirley Carreira

domingo, 1 de novembro de 2009

Desejos



Deságua a minha poesia
Em todos os teus mares,
Ondulam os meus versos
Nos teus possíveis relevos,
E, à tua lembrança, desabo:
Um temporal de desejos.

Shirley Carreira

Mediatriz

Entre o meu discurso e o teu
O silêncio
Do orgulho.
Entre o meu corpo e o teu
A distância
Da mágoa.
Entre o meu desejo e o teu
A lacuna
Da palavra.
Entre o real e a fantasia
As dobras
Da poesia.
Entre o reencontro e a saudade
A inconsciência
Da falta.

Shirley Carreira

Noite

Branda é a brisa que a noite acolhe
Em seus braços- filho nascituro;
Suaves são os sonhos que nascem
E invadem as mentes delirantes
Dos seres apaixonados que dormem.
Loucos os desejos que eles trazem,
como corpos de amantes enlevados,
como dança frenética ensaiada
passo a passo, rompendo a madrugada.

Shirley Carreira