quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Sou assim...




Sou esta mulher que vês por inteiro
Com defeitos tantos, permanentes
Ou passageiros,
Com desejos muitos, inconfessos
Ou conhecidos,
Com tantos momentos vividos.

Sou este ser exposto ao teu olhar
Com verdades tantas, doloridas
Ou suportáveis,
Com saudades muitas, contidas
Ou transbordantes,
Com tantos silêncios recolhidos.

Sou esta criança em corpo errado
Com segredos tantos, violados
Ou guardados,
Com vontades muitas, suprimidas
Ou realizadas,
Com tantos sonhos construídos.

Sou este ser forte/frágil que te olha;
Sou a mulher/criança que te sorri,
Que levanta e cai, sem medo,
Que se entrega e luta contra a maré.
Que se quer aceita e amada
Do jeito confuso, complexo que é.

Shirley Carreira

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Perdão


Bendito o perdão sem palavras,
Que escorre dos olhos quieto
Como afago suave na alma,
Como carícia branda do vento,
Cristalizando na vida um momento
Perfeito de completa entrega.

Bendito o perdão sem cobrança,
Que varre da alma sem medo
Tudo o que turva a lembrança
E acolhe em braços invisíveis
Aquilo que parecia perdido,
Impossível, irrecuperável.


Bendito o perdão que se inscreve
Nas nuvens, como fênix renascida,
E em suas asas carrega a esperança.
Bendito o coração que o doa;
Bendito aquele que o recebe;
Bendito o mundo em que ele é possível.
Shirley Carreira

domingo, 29 de novembro de 2009

As faces da saudade



Saudade não é apenas falta
Do que se teve e se perdeu,
Mas a lacuna dos incontáveis
Momentos que não se viveu.

Os olhos buscando insaciáveis
Imagens que a memória retém
Fragilmente, e que, de repente,
Qual sonho, turvam-se; vão e vêm.

Saudade é aquilo que se sente
De um futuro que nunca existiu,
De todos os anseios contidos,
De alguém que um dia partiu.

Saudade dos gestos reprimidos,
Da palavra pensada e não dita,
Dos desejos jamais saciados,
Da promessa de alegria infinita.


Shirley Carreira

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O poema de hoje

O poema de hoje
se recusa a ser moderno,
audacioso; contumaz,
quer-se apenas versos normais
que sussurram ao ouvido,
em murmúrios e gemidos,
o que os lábios
calam.

O poema de hoje
não almeja a rebeldia
da forma, o desafio
de ser "boa" poesia;
quer a simplicidade
da fala hodierna,
o transbordamento
do eu.


O poema de hoje
ignora a o urgência do tempo,
o ontem e o amanhã;
quer apenas o ato egoísta,
que escapa à técnica
e salta à vista:
olhar, atento, para dentro
de si.

Shirley Carreira

domingo, 22 de novembro de 2009

Teus caminhos

No azul dos teus olhos,
Um mar imenso,
Onde navego de olhos fechados:
Mergulho e entrega.

No toque de tuas mãos,
Um paraíso inteiro,
em que me recrio continuamente:
Desejo e êxtase.

Nas estradas de teu corpo,
Um oásis infinito
Onde deixo as minhas marcas:
Conhecimento e memória.

Shirley Carreira

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Palavras alheias...

RECEITA DE CASA....

Uma casa deve ter varandas
para sonhar, cantos para chorar,
quartos para os segredos
e a ambivalência.
Um amor precisa espaço de voar,
liberdade para querer ficar,
alegria, e algum desassossego
contra o tédio.
Não se esqueçam os danos a cobrir,
o medo de partir,
e o dom de surpreender
_ que é a sua essência.

Lya Luft

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Em segredo




Os passos calcaram a terra
Os sonhos ganharam as estradas
Os braços perderam-se no fosso
De incontáveis abraços
E as bocas lançaram laços
Às almas ressequidas.
Em segredo, teceu-se a teia
Incontrolável da vida.

Shirley Carreira

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

domingo, 8 de novembro de 2009

Mulher



Mulher

Não sou a mulher dos teus sonhos
Mas deixa-me, ao menos,
Invadir tua mente, sorrateiramente,
e roubar um pensamento teu.
Não sou a mulher que quiseste
Mas deixa-me, em teu sono,
Habitar teus desejos ocultos.
Não quero ser a mulher ideal.
Quero ser aquela mulher fugidia,
Que prende o teu olhar
Quando tu o desvias.
Quero ser aquela
Que, sem que tu permitas,
Faz parte da tua fantasia.

@Shirley Carreira

sábado, 7 de novembro de 2009

Deixa-me



Deixa-me sussurrar em teu ouvido
Um verso ousado, atrevido
A tatear os teus desejos
Sem o menor rastro de pejo.

Deixa-me desenhar no céu da tua boca
A minha marca, ardente, louca,
A sondar na tua saliva
A corrente que te ativa.

Deixa-me cravar em tua pele
O signo da paixão que me impele
A transformar-me, de mera passageira,
Em amante de uma vida inteira.

Shirley Carreira

A versificação do amor



















A versificação do amor
é sempre um quiasmo,
onde tudo se troca,
onde nada pertence a um só.
A versificação do amor
É feita de rimas perfeitas,
De aliterações e consonâncias
E de metáforas oníricas.
É repleta de hipérboles,
Carente de omissões.
A versificação do amor
Não deve ter métrica certa.
A variável, a surpresa,
Faz, do poema, a fortuna.
A versificação do amor
Não precisa de receita,
Mas de um homem e uma mulher
E de um permanente sentimento
De distanciamento do mundo.

Shirley Carreira

Saudade e silêncio
















Quando um amor
Se torna labirinto
E suas estradas levam
A lugar nenhum
A distância resgata
O que resta do sonho
E a chama perdura
Através da saudade.

Quando a imagem
Que se forma na mente
Distancia-se de todo
De seu referente
E só se encontram
Quando os olhos se fecham,
É o tempo da distância,
É o tempo do sonho.

A distância e a saudade
Fazem mais pelo amor
Que em si não se sustenta
Do que as idas e vindas
E a alegria fugidia,
Entremeada de dor,
De mágoa e de tormenta.
Na saudade tudo silencia.

Shirley Carreira

Se eu me calar











Não te espantes se eu calar meu verso,
com meu silêncio não te surpreendas;
comigo mesma vivo em contendas.
Na poesia, reúno e disperso
todos os fragmentos de mim.
Se me calo, eu me preservo.

Não te espantes se eu não deixar rastro,
não te assustes com minha ausência,
pois, da palavra, a permanência
é retrato preciso de um mundo vasto
que trago dentro de mim.
Se me calo, eu me oculto.

Não te surpreendas se eu me calar,
se partir sem dizer adeus,
se este poema parece acenar
com lágrimas dos olhos meus,
cascata caudalosa a escorrer da alma.
Se me calo, ela se acalma.

Ficam os gestos apenas ensaiados,
ficam os poemas mal iniciados,
sombras líricas de algo concreto.
Ainda que não possas lê-las,
minhas palavras permanecem.
Na noite do meu silêncio,
elas se tornam estrelas.
* * * * * * * * * * * *
Shirley Carreira

domingo, 1 de novembro de 2009

Desejos



Deságua a minha poesia
Em todos os teus mares,
Ondulam os meus versos
Nos teus possíveis relevos,
E, à tua lembrança, desabo:
Um temporal de desejos.

Shirley Carreira

Mediatriz

Entre o meu discurso e o teu
O silêncio
Do orgulho.
Entre o meu corpo e o teu
A distância
Da mágoa.
Entre o meu desejo e o teu
A lacuna
Da palavra.
Entre o real e a fantasia
As dobras
Da poesia.
Entre o reencontro e a saudade
A inconsciência
Da falta.

Shirley Carreira

Noite

Branda é a brisa que a noite acolhe
Em seus braços- filho nascituro;
Suaves são os sonhos que nascem
E invadem as mentes delirantes
Dos seres apaixonados que dormem.
Loucos os desejos que eles trazem,
como corpos de amantes enlevados,
como dança frenética ensaiada
passo a passo, rompendo a madrugada.

Shirley Carreira

sábado, 31 de outubro de 2009

Los ojos



Abrimos tanto los ojos al mundo

que perdemos los detalles del camino.

Mi camino son las sombras en tus ojos,

el abismo donde muere mi razon...

ellos hablam quando tú te callas.

No hablam en ningún idioma,

pero dicen entre sombras y sueños

lo que quieres en secreto.

Shirley Carreira

Saudade

Meus olhos, postos no infinito,
Desenham o contorno de uma falta,
Desvelam o vazio de uma ausência,
Delineiam, em transparência,
Teu nome, em nuvens e céu.

Meus lábios mudos e quietos
Suprimem palavras que jorram,
Sufocam o que no peito arde,
Selam-te, para sempre, no abismo
Sempiterno da saudade.


Shirley Carreira

domingo, 25 de outubro de 2009

Minha alma tem pressa

Há que prolongar o tempo que voa
E em suas asas fazer florescer os sonhos
E desejos de uma vida inteira;
Há que tornar verdadeiras
Promessas amareladas
No baú do esquecimento.
Há que fruir todos os beijos
Com o gosto do primeiro
E sucumbir ao calor de abraços
Há que verter carinho e alegria
Como se este fosse o último dia.
Há que falar de amor e deixá-lo nascer
Entre as pedras da indiferença.
Há que retornar sobre os próprios passos
Revisitar tudo o que se fez
E aprender com o retorno.
Há que ser criança outra vez.

Shirley Carreira
25/10/2009

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Canção da espera

Para Álvaro Carreira Neto


Para meu filho ‘inda não nascido
Eu sonho tantas quimeras,
O universo do não vivido,
A mais eterna das primaveras.

Para esse anjo ‘inda adormecido
Sonho com um mundo de algodão,
Sem dores, sem choques, amortecido
Com o desvelo do meu coração.

Para essa frágil criaturinha
Por quem transbordo de carinho,
Ensaio contos da carochinha,
Baladas para cantar bem baixinho.

Por essa chama crescente
Que me consome e aquece
É que sempre elevo minha mente
A Deus, em silenciosa prece.

Shirley Carreira

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Inspiração

Cada verso que sangra, denso,
A minha alma translúcida
Tinge o tempo da escrita
Com as marcas da existência.

Cada palavra que surge, tensa,
Do meu pensamento volátil
Tange a corda da vida
Com harmonia impensada.

Cada poema que brota, súbito,
Das emoções em destempero
Torce com força e esmero
A minha mente absorta.

Tudo que traduzo em palavras,
Que em símbolos codifico,
Transborda a nebulosidade
Do que experimento e sinto.

Shirley Carreira

domingo, 11 de outubro de 2009

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sábado, 10 de outubro de 2009

Palavra exilada

Retornas imprevista
palavra exilada
de mim, do mundo, da alma das coisas.
Retornas carcomida
pelo medo dos homens,
triturada pelas dores
de antigos amantes.
Retornas névoa, sorrateira, dolorida,
com as marcas do tempo,
as pegadas da história.
És promessa, diálogo, registro.
És saudade, nostalgia, memória.


Shirley Carreira

Sofreguidão




Meus olhos te consomem

e a boca voraz

saboreia a espera.

Shirley Carreira

Divulgando a poesia alheia...

SE EU NÃO FOSSE...

Como não derramar
essa poesia
coagulada na retina
Se eu não fosse
essa escrita
não seria outra coisa
senão o silêncio
Um olhar alheio
pendurado num varal
Seria uma noite
tão noite, como
uma sombra densa
onde crestam os
pensamentos.

Marcos Oliveira

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Mutação

Sem recordações, sem tua imagem,
Sem as palavras a ecoar
No fundo das minhas lembranças
Eu me calo.
Sem os pequenos gestos,
Que te faziam grande
Ante os meus olhos de espanto
Eu me renego.
Sem o calor a assomar à pele,
Sem tua voz vibrando
Ousada em meus ouvidos
Eu me recolho.

A desconhecida que vejo
Na superfície do espelho
É lava petrificada,
Memória holográfica
Do vulcão cá dentro de mim.

Shirley Carreira

domingo, 4 de outubro de 2009

Poema para as vozes que se calam


Para Mercedes Sosa
04/10/2009

O tempo passa
E as vozes se calam;
Não mais sua música
Transborda aos ouvidos,
Mas fica a magia
Dos tempos idos;
Fica a saudade
Da limpidez cortante
Que retine na alma:
Sentimentos profundos.
Vão-se as vozes,
Mas fica a lembrança
A ecoar entre os mundos.

Shirley Carreira

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Poema do amor distante




Quero-te como quem busca um sonho
Feito de música e estrelas
E se inebria com a sinfonia
De sua passagem no céu, ao vê-las.
Quero-te como quem corta oceanos
Em frágeis barcos de papel
E arde ante a majestade
De tuas ondas, estradas de mel.
Quero-te como quem olha à frente
Um paraíso por descobrir
E se ufana ante a luz que emana
Da tua presença, eterno luzir.
Quero-te como quem ama à distância
Buscando alcançar-te a cada dia
E traduz o amor que lhe seduz
Nas asas lépidas da poesia.



Shirley Carreira

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Poema em espera




Um dia
Há de brotar das mãos
Fluida poesia
Embriagada de música
Da simetria
Exalada da alma
Que se inebria
Do ópio avassalador
Da densa loucura
Que se chama amor.

Shirley Carreira

sábado, 5 de setembro de 2009

A mulher que sou


Sou um mosaico de muitas mulheres
Das tantas que habitam em mim:
Sou meio adulta, meio criança,
Meio descrédito, meio esperança,
Meio inocente, meio sagaz,
Meio sensual, meio angelical.
De todas as metades que me compõem
Nenhuma prevalece afinal.

Shirley Carreira

sábado, 29 de agosto de 2009

Palavras

De cada palavra
Que me surge
Como se fosse lágrima
Faço um segredo
De cada palavra
Que me surge
Como se fosse medo
Faço uma guerra
De cada palavra
Que me surge
Como se fosse fera
Faço um encanto
De cada palavra
Que me surge
Como fosse pranto
Faço silêncio.

Shirley Carreira

Em tua carne

Nessa tua carne
Habitam solitários
O sopro e o assombro
Do gesto omitido
A sépia e a seiva
De primavera enrustida
O aguardar lancinante
Do degelo.
Nessa tua carne
Residem incógnitos
A chama e a cinza
Do desejo elíptico
O rasgo e o sangue
Do amor suprimido
O sufocar constante
De um eu mal contido.

Shirley Carreira

Poema devaneio

Trago um sonho no olhar.
Um sonho que canto em versos
e que nunca coube no universo
que existe fora de mim...

Trago na mente uma imagem
Que tem sido apenas miragem,
Oásis, refúgio, breve interlúdio,
Numa sinfonia árida sem fim.

Trago em mim uma esperança
Que se refugia, como criança.
Uma fantasia, que surge e se esconde,
E me habita não sei onde.

Shirley Carreira

Em noites sem luar

Pequeno é o firmamento
Para a minha rima errante
Vago, o caminho que sigo,
Mas ´inda que tortuoso
Guarda algo de brilhante
Pois levo a poesia comigo.

E levo versos sem pompa
Mas plenos de alegria
Levo estrofes douradas
Pela minha fantasia

E se acaso não houver luar
Na noite do meu afeto
Haverá um poema quieto
Em pradarias deitado
Tendo o céu como teto

Shirley Carreira

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

No olhar


Guardo no olhar o desvario
Das madrugadas insones,
Os abismos das paixões intensas,
Os medos dos passos não dados.
Trago na fronte os traços
Dos desejos ocultos,
Na pele, o frêmito, o arrepio,
De conhecidos gestos.
Guardo em mim mesma
Promessa e desatino,
Atalho e labirinto
Poesia e desassossego.

Shirley Carreira

Nudez




Nua
Assim está minha alma
diante do universo.
Pura
Como o princípio
De todas as coisas.

Nua
Assim está minha mente
Diante dos mistérios
Lúcida
Como a consciência
De todas as eras.

Nua
Assim está minha pele
Diante de mim mesma
pronta
Como receptora perene
De todas sensações possíveis.


Shirley Carreira

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Incógnita





Tecem-se os amanhãs
Com os sonhos de hoje
E os tropeços de ontem
Costurando idéias
E horizontes.
Tecem-se os desejos
Com os novos anseios
E as velhas conquistas
Urdindo gestos
E paixões.
Ainda assim, na malha do tempo
O amanhã é apenas incógnita.




Shirley Carreira

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Viagem



As estradas do teu corpo
Tantas vezes percorridas
São as tramas do meu verso
Dessa emoção contida
Que grito ao universo
Na discreta melodia
Feita de sonho e palavras
Que se chama poesia.

Shirley Carreira

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Entre(meios)

Em silêncio
Teço a corrente infinita
Da palavra.

Em suspenso
Cavo as trilhas profundas
Que ela lavra

Em ausência
Deixo um rastro do verso
Que buscava.

Shirley Carreira

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Querendo-te



Quero-te no limite
Entre o sonho e a vida
Quero-te na confluência
De meus mares
Quero-te no ímpeto
Das loucas paixões
Na brevidade intensa
Da troca de olhares.

Quero-te, sem querer,
E assim querendo,
No peito, trago o conflito
Entre querer-te
E, sabendo-te distante,
Mais longe desejar-te,
Na vã tentativa
De esquecer-te.

Quero-te no encontro
De sentimentos abissais,
Quero-te no turbilhão
De desejos incontidos.
Quero-te na memória:
Uma presença fugidia,
Com a magia intensa
Dos amores não vividos.

Shirley Carreira

Signo

Onde te escondes
palavra que busco
dicionário afora,
vida afora,
e não encontro?

Onde te escondes
símbolo oculto
do meu pensamento,
que não te sei
e não te invento?

Na tua ausência, sigo
na busca indescritível
do signo perfeito
que torna a idéia possível.

Shirley Carreira

Claridade





Luzes já não luzem lá fora.

Fora luziam as luzes outrora.

Hoje, elas luzem cá dentro.

As luzes são lágrimas agora.

Hão de luzir as luzes

No lugar das lágrimas luzidias

Quando ficarem lá fora

As foragidas fantasias?


©Shirley Carreira

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Exceção



Dolorido o amor de quem canta sozinho
Tentando fazer audível sua voz solitária;
Sofridos os passos de quem tenta ser estrada,
Quando sua conformação é de atalho.
Triste a história de quem se tornou sombra
E apagada existe em meio a céu estrelado.
Loucura é tentar apagar a luz da lua
Quando só ela existe, em brilho, para o mar aberto.
Solitário os rumos de uma flor do campo
Que floresce entre lírios e assim permanece,
Sabendo que, na essência, é uma rosa bela.
Estranho guardar em si torrentes insondáveis
De mistérios, prazeres, surpresas infinitas,
E aos olhos que se buscam, dia-a-dia,
Ser apenas um pálido conjunto de exceções.

Shirley Carreira

domingo, 12 de julho de 2009

Poema de saudade



Faz-se a poesia quando a alma nua
Arde,consciente de cada falta tua,
E percorre quieta a lembrança,
A saudade que nunca se cansa
De doer cá dentro de mim.


Faz-se poesia após tantos silêncios,
Tantas lacunas, no tempo, somadas,
Tantas fantasias mal sufocadas,
Quando em mim tua imagem habita
E faz ainda mais forte a paixão infinita.


Faz-se a poesia quando ainda me nego
E a sede me invade, mesmo se renego
Cada estilhaço de amor dentro de mim.
Faz-se a poesia e renova-se a magia
De um sentimento que não tem fim.


Shirley Carreira

Poeta(ndo)

Da palavra à coisa
flutua o verso
signo e sina de quem doma sentidos.

Shirley Carreira

Silêncio

Meus silêncios são acordes da alma
Recriados nos labirintos
Da solidão que me habita
Da quieta dor que sinto.

Meus silêncios são as ausências
Os vazios construídos
Por todas as palavras não ditas
Pelos sonhos não vividos.

Meus silêncios são essas lacunas,
Esse grito inconsciente, mudo;
Esse encontrar sempre o nada
Onde antes havia tudo.


Shirley Carreira

Corpo de mulher


No corpo de cada mulher
Há uma morte silenciosa;
Em cada curva sinuosa,
Em cada concavidade oculta.
Em cada dobrar de tronco
Em cada gesto leve
Ou aceno de mão;
No corpo que arde
Sobre o branco lençol,
Que estanca na carne
O fluxo voraz da paixão.
No corpo de cada mulher
Há uma deusa escondida,
Que inebria, entontece,
Encanta e seduz.
No corpo de cada mulher reluz
O seu comando do tempo,
A sua milenar magia.
No corpo de uma mulher
Um homem renasce e morre
Todos os dias.

Shirley Carreira

Se...

Não fossem as sombras constantes em teus olhos;
Não fosse essa ironia sempre presente
No teu sorriso; a alegria crescente;
A indiferença impiedosa e permanente,
Quem sabe se eu ainda te amaria?

Não fosse o teu desejo transbordante;
Não fosse o teu querer pulsante
Que busca e afasta, intermitente,
Aquilo que deseja; incoerente,
Quem sabe se eu ainda quereria

De tal modo voraz e persistente
Essa tua boca sôfrega, exigente,
Esse teu corpo ansioso e indolente,
Esse teu eu, tão meu e tão ausente.
Quem sabe se eu ainda existiria?

Shirley Carreira

Minha sina




Minha sina é ver-te
na linha do horizonte
onde toda razão se desatina,
onde todo equilíbrio
se torna desvario,
onde eu, mulher, viro menina.

Minha sina é querer-te
e sonhar-te dias a fio,
tão distante quanto do teu toque esteja
pois assim mais perto
meu corpo te deseja
e tanto mais a paixão me ensina

que meu olhar do teu anda à procura
que nada sou sem essa doce loucura
de, a cada dia que se finda,
inebriada, desejar-te mais,
e, insanamente, buscar-te ainda.

Shirley Carreira

A teus pés




As lágrimas
(sólidas)
que me enfeitam
os olhos.


A passividade
(tórrida)
que me impede
os gestos.


Os seios
(túrgidos)
que pulsam
no peito.


O desejo
(líquido)
que se derrama
em mim.


É todo um corpo que reclama
Tua presença e se esparrama,
Transbordante, a teus pés.


Shirley Carreira

Despindo palavras



Se me visto com a palavra sonho
é porque despi a esperança
em algum lugar do passado.
A cada palavra que visto,
de outras tantas me dispo
e em cada verso que traço
de um antigo eu me desfaço.
A palavra é roupa que veste
A alma despida em silêncio.


© Shirley Carreira

Imagem no espelho



A desconhecida que me olha
do outro lado do espelho,
sorri alegria impensada,
que eu apenas pressinto.
E se ela não me diz nada
de tudo o que sabe e eu não sei,
em seu sorriso de absinto,
planto o abismo de imagens
de tudo aquilo que sinto
e jamais escreverei.

@ Shirley Carreira

A matéria do poema




















A matéria do poema:
palavra e pensamento,
memória e sentimento,
lacuna e preenchimento
dos espaços da alma.
Meandros do verso
que se quer inteiro,
embora feito de partes,
metades: o eu que sou
e o eu que nunca fui.
O poema se condensa
no desafio do verbo,
que traduz o não dito,
construindo sentidos.
A matéria do poema:
pensamento e palavra,
bloco de granito,
que minha mão lavra.


Shirley Carreira